Energia nuclear Fukushima relança o debate

14 março 2011 Presseurop

Seja qual for a amplitude do acidente nuclear na central japonesa de Fukushima, os seus efeitos já se fazem sentir na Europa. “O debate que, aparentemente, iria diminuir ao ritmo da lembrança de Chernobyl, ressurge com toda a brutalidade”, constata Le Figaro. O diário parisiense explica que o que se passa no Japão representa “um golpe extremamente violento que se abate sobre a atividade nuclear mundial”. A subida do petróleo em 2008 “permitiu que se falasse do sonho do átomo civil em todo o mundo”, e que “Bruxelas, animada por Paris, inscrevesse explicitamente o nuclear entre ‘as energias descarbonizadas’, a par da energia hidráulica, solar, ou eólica”.
“Em nenhuma região do mundo é tão importante a energia nuclear como na Europa“, sublinha Die Welt. Em média, o nuclear satisfaz 15% das necessidades mundiais de energia elétrica e as 144 centrais europeias produzem 30% da eletricidade consumida. 71% dos cidadãos da UE vivem num país com reatores dentro de fronteiras.
Mas hoje, escreve Le Figaro, "os opositores ao nuclear retomaram o seu vigor em toda a Europa. Na Alemanha, onde o Governo conservador-liberal de Angela Merkel fez aprovar, no outono de 2009, o prolongamento da duração de vida dos 17 reatores nucleares do país (...), na Áustria, um país tradicionalmente hostil à energia nuclear, o ministro do Ambiente, Nikolaus Berlakovich, defendeu um ‘teste de stresse’ às centrais europeias (...), na Grã-Bretanha, onde o Governo de Cameron relançou um programa de construção de centrais e acordou, em outubro, oito novos locais, o ministro da Energia, Chris Huhne, manifestou o seu acordo a um inquérito ‘para retirar as ilações necessárias’ sobre o assunto, visto que, em junho, se irá decidir o recurso à tecnologia EPR da Areva e da EDF”.
O choque é tal que nos encontramos no “fim da era nuclear", não hesita o título do Spiegel. O semanário alemão exige a revisão da doutrina do risco zero: “Obviamente que o Japão é uma zona sísmica, facto que aumenta o risco e representa uma diferença entre o Japão e a Alemanha ou a França. Mas o Japão também faz parte das indústrias mais desenvolvidas, onde engenheiros bem formados e minuciosamente corretos constroem os automóveis mais modernos e mais fiáveis do mundo. Na época da catástrofe de Chernobyl, a indústria nuclear alemã foi capaz de engolir e de fazer engolir que na Europa de Leste os reatores eram obsoletos e os engenheiros incapazes e negligentes. Sabemos agora como essa ideia era pretensiosa. […] Basta uma série de acasos infelizes [e] Fukushima é mundial.”
Há muitos anos, lembra Der Standard, "houve dúvidas sobre a segurança das centrais da Europa de Leste, como foi o caso de Mochovce [Eslováquia], ou Temelín [República Checa, perto da fronteira com a Áustria]. Mas quando se trata de centrais alemãs, as críticas baixam de tom. Por exemplo, "há muitos anos que se sabe que a central de Neckarwestheim, em Bade-Wurtemberg, se encontra numa zona sísmica".
Esta vulnerabilidade faz pensar que "as questões centrais não encontram respostas evidentes": Domina-se a técnica? É possível tornar as centrais mais seguras? É possível garantir uma eliminação em segurança dos resíduos? “Cabe à UE lançar o controlo de todas as instalações nucleares na Europa”, considera o jornal, que estima que a proposta do ministro austríaco do Ambiente, Nikolaus Berlakovich, de organizar testes de stresse às centrais nucleares “revela muito bom senso”.
Será prudência ou histeria? Desde 1979, data da fuga radioativa na central americana de Three Miles Island, “que fizemos progressos tecnológicos”, nota o Hospodářské noviny. Contrariamente a 1986, data da catástrofe de Chernobyl, “já não existe um regime comunista que, por princípio, faz pouco da segurança do seu povo” e a Europa não se encontra, maioritariamente, numa região sísmica ativa. Por isso, assegura o diário checo, "abandonar a energia nuclear é tanto mais aberrante quanto é sabido que as fontes alternativas de energia são limitadas". "A boa reação a Fukushima", estima o jornal, "não será fugir do nuclear em pânico, mas chegar a boas conclusões sobre o que aconteceu e melhorar as medidas de segurança".
O acidente de Fukushima não deve ser subestimado, nota, por seu turno, o editorialista Sergio Rizzo, no Corriere della Sera, mas “a emoção compreensiva provocada por esta tragédia não deve determinar as escolhas fundamentais para a nossa política energética. Já o fizemos e já nos escaldámos: o referendo antinuclear de 1987 passou por larga maioria por causa do choque do acidente de Chernobyl”. Mas em vez de levar às prometidas energias verdes, este voto pelo encerramento das centrais italianas conduziu a uma nova dependência do petróleo.
É precisamente o que refere De Standaard, na Bélgica: "Temos de pagar o preço do nosso modo de vida”, pois, “como não estamos preparados para mudar radicalmente o nosso consumo, temos de admitir que a eletricidade produzida a preços acessíveis implica um risco”. É neste contexto que, por um acaso do calendário, o Governo belga lança esta semana uma campanha para “informar a população dos comportamentos de proteção em caso de acidente nuclear".

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